Segmento de lotes apara arestas e busca alternativas para crescer

O segmento de loteamentos é a prova de que o Brasil é mesmo feito de muitos ‘Brasis’. Constituído quase em sua totalidade por empresas locais, tradicionais e familiares para atender a realidades e demandas muito diversas, esse mercado só mais recentemente vem tentando alçar voos maiores. O movimento de profissionalização dos players, iniciante mas crescente, é um importante sinal nesse sentido.

As particularidades e perspectivas do setor foram tema de rodadas regionais do Fórum Loteamentos realizadas pelo GRI entre junho e agosto e seguem em pauta no GRI Loteamentos & Comunidades Planejadas 2017, que vai reunir empresários e investidores de todo o País em setembro.

“Cada cidade tem um loteador diferente, que se adapta a culturas locais bem peculiares”, afirma Luiz Gerab, sócio da gestora de crédito privado Captalys.

Ele lembra que, sobretudo nas regiões Sul e Sudeste, já há empresas com uma gestão mais sofisticada, com balanços auditados e adoção de regras de governança, o que permite controlar melhor as carteiras e obras. “Apesar disso, o loteador brasileiro está hoje mais preocupado com a sobrevivência e, em geral, ainda não percebeu – como aconteceu nos anos 1990 com as incorporadoras – que, quanto mais se mostrar preparado, menor vai ser o seu custo de funding”, diz.

Licenciamento ambiental

Se a questão é estar preparado, o licenciamento ambiental é uma das provas mais duras a encarar. Para Marcos Saes, sócio do Saes Advogados, é papel de quem empreende saber dos riscos e se resguardar de tudo o que for possível. “É preciso entender da localidade, saber o que funciona e como fazer. Muitas coisas podem ser evitadas e, no caso das que não podem, deve-se estar pronto para resolvê-las”, orienta.

Levar uma questão ambiental ao Judiciário é “terrível” e o descumprimento de qualquer requisito nessa área pode embargar a obra, adverte Marcos.

Ele recomenda que a loteadora seja, acima de tudo, proativa e que tenha conhecimento técnico impecável, além de uma boa relação com a comunidade local, os órgãos municipais e o Ministério Público. “Quase nada em licenciamento ambiental é excesso de zêlo”, garante.

Panorama do mercado

Não é só o Ministério Público que monitora o mercado. O próprio consumidor cumpre esse papel e está atento à saúde das empresas. Algumas passam hoje por dificuldades e o risco é de que essa percepção se generalize e acabe prejudicando o setor, justamente num momento em que ensaia uma reaceleração, após uma fase difícil – que acometeu também outros segmentos imobiliários e boa parte da economia nacional.

A sensação geral é de que o fundo do poço já foi alcançado e agora é hora de agir de forma planejada, com projetos bem estruturados e oferta de produtos consistentes. “Compartilho dessa percepção. Existe uma retomada do consumidor. Saímos de um cabo desligado para um motor ligado”, resume Fábio Valle, diretor executivo da empresa de planejamento imobiliário V7brasil.

Ele alerta que o cliente está mais exigente. “Cada vez mais, o que leva à compra é a busca pela melhor oportunidade.”

O executivo acredita que o produto imobiliário continua sendo visto como moeda forte e que haverá uma migração do capital financeiro para a compra de lotes (inclusive à vista) à medida que os juros forem caindo. “Produtos bem organizados e posicionados em relação a preços têm espaço”, assegura.

Nesse aspecto, o timing do negócio aparece como principal ponto de atenção. “Um bom planejamento, desenvolvido no ritmo necessário para um empreendimento decolar e que seja capaz de fazer uma leitura antecipada de demanda, dá confiança no resultado ou a chance de corrigir algo”, comenta.

Mapeamento da demanda

Uma pesquisa da consultoria em inteligência estratégica Brain apresentada em primeira mão na série de encontros do GRI revela espaço para boas oportunidades de negócios no ramo de loteamentos.

A sondagem, conduzida em maio junto a mais de 2 mil consumidores em 87 cidades brasileiras, indica que 38% estão em busca de um imóvel residencial (casa/sobrado, apartamento ou terreno) para comprar. Dentro dessa fatia, 12% dizem querer especificamente um terreno. É no Nordeste que está o maior apetite por lotes atualmente. Em meio aos potenciais compradores de imóveis residenciais na região, 15% declaram desejar terrenos. No Sul, são 14%; no Sudeste, 8%; e no Centro-Oeste, 5%.

Quando se trata de aquisições efetivas de lotes nos últimos 12 meses, o Sudeste aparece como a área em que se registrou maior preferência pelo produto. Dos que compraram imóveis residenciais na região nesse período, 19% optaram por terrenos. No Sul, foram 18%; no Nordeste, 17%; e no Centro-Oeste, 11%.

O principal determinante na decisão de compra de lotes é hoje o valor, a não ser na região Sul, onde a segurança vem na dianteira. A localização, em todas as partes do País, aparece na segunda posição.

“Demanda se cria; tanto que, mesmo que a demanda primária de terrenos no Sudeste seja de cerca de 8%, a compra efetiva nos últimos 12 meses correspondeu a mais do dobro desse percentual [19%], em especial com o aumento da procura por investimento em lotes”, nota Fábio Araújo, sócio diretor da Brain.

E há mais indícios relevantes de que o tamanho do mercado pode se estender. No Sudeste, uma grande parcela dos consultados pela Brain (59%) diz que consideraria adquirir um terreno residencial em loteamento ou condomínio fechado. Nesse universo, só 10% pensam em lotes grandes, acima de 351 m². “A maioria [69%] quer áreas entre 181 e 350 m² e não aceita pagar muito”, acrescenta Araújo.

Quase metade (49%) desses potenciais compradores na região se disporia a desembolsar de R$ 70 mil a R$ 200 mil por lote, e é nítida a preferência (71%) por parcelas mensais pequenas, de até R$ 1 mil, e por prazos não muito longos, de no máximo 60 meses (55%).

Oferta baixa

Se, por um lado, a demanda existe, por outro, a oferta ainda é baixa no Brasil, consequência da falta de crédito e das dificuldades de financiamento. Conforme a Brain, considerando as 30 maiores urbanizadoras do País, em dezembro de 2016, do VGV lançado de R$ 29,78 bilhões, 19,9% estavam disponíveis. No Sudeste, o estoque remanescente era de 17,6%.

A consultoria sinaliza um quadro em que a média de preços se mostra adequada à demanda e o crédito direto concedido pelo loteador representa uma vantagem competitiva considerável, já que o maior concorrente dos terrenos (em especial para os de até R$ 100 mil) vem sendo a casa pronta ou o apartamento Minha Casa Minha Vida.

“É fundamental ter em mente que crises longas mudam comportamentos. Quando a demanda se reaquecer, o cliente não vai querer pagar preços altos”, prevê Fábio Araújo. Ele pontua que o sucesso do negócio está diretamente ligado a uma série de fatores, como a possibilidade de oferecer uma proposta de valor irrecusável (uma forma vantajosa de pagamento, por exemplo).

Alternativas de crédito

É largamente conhecida a escassez de funding para o segmento loteador, agravada, no caso dos empreendimentos populares, pela reinante informalidade da renda dos compradores.

Os bancos não dispõem de alternativas específicas em carteira para o setor – exceção feita à Caixa Econômica Federal, que recentemente anunciou o lançamento de uma nova linha para financiar a produção de lotes – e, quando concedem crédito, fazem uso de estruturas pouco flexíveis, passíveis de descasamento com o caixa do empreendimento.

Frente às dificuldades, um número significativo de loteadores tem buscado sofisticar sua gestão e seus processos de comercialização, em busca de novos mecanismos de financiamento capazes de dar mais velocidade e segurança aos projetos.

A securitização de recebíveis é um dos caminhos mais indicados, especialmente para empresas que precisam de caixa para tocar empreendimentos simultâneos, e hoje é possível colocar Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) no mercado a taxas mais baixas do que anos atrás. “Nunca tive um pipeline como agora. Estamos executando 19 CRIs ao mesmo tempo. A demanda por esses papéis é grande. O mercado está querendo renda fixa”, conta Arley Fonseca, sócio da Ápice Securitizadora.

A securitização exige preparo: a carteira precisa ser madura e estar em ordem. O investidor não está disposto a aceitar o risco da pessoa física e rejeita a prática corrente de assinatura de contratos particulares de compra e venda sem previsão de alienação fiduciária ou por escritura pública. Ele pede um documento definitivo, registrado em cartório.

Entre os critérios que definem se um empreendimento é elegível à securitização está o valor mínimo do lote. A Ápice, por exemplo, requer que seja de pelo menos R$ 80 mil. “Mais baixo do que isso significa uma pulverização que gera mais custos operacionais”, justifica Arley.

Mais uma opção de funding chegou ao mercado recentemente, pelas mãos da Captalys. Trata-se do Mais Lotes, um produto customizado para financiar a infraestrutura de loteamentos. O diferencial é permitir que o loteador pague as parcelas do crédito tomado de modo sincronizado com o fluxo de caixa do empreendimento. “Flexibilizamos muitos pontos para aprovar o crédito”, diz Luiz Gerab.

Inteligência de venda

O sucesso comercial de um loteamento depende diretamente da estratégia de vendas. “Se não der certo, é possível que vários aspectos não tenham sido considerados”, defende Fábio Valle, da V7brasil.

O erro pode estar muitas vezes na localização. Entretanto, se estiver no produto em si, é bom repensar tudo. “Procure os motivos emocionais que levam [o consumidor] à tomada de decisão. Ninguém compra metro quadrado. As pessoas sonham com um estilo de vida. Um preço adequado ao produto é tão importante quanto entender o mercado a fundo. Pesquise tudo”, instiga.

Além disso, Fábio recomenda estabelecer sinergia e conexão de trabalho com as equipes de vendas e marketing (agência de comunicação, publicidade e trade). “Essa composição pode fazer diferença lá na ponta, assim como a interação com o cliente. O ponto-chave é como precificar o produto. Devemos criar um senso de oportunidade que tire o cliente da sua zona de conforto e o impulsione para a compra. Ele deve ‘brigar’ pelo produto”, afirma.

Fonte GRI Magazine

Postado em 11/09/2017

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