Demarcação de terrenos de marinha: a maré pode virar

De acordo com o Decreto-Lei n. 9.769/1945, os terrenos de marinha são medidos horizontalmente, em uma profundidade de 33 metros, em direção à parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831 (definida pela média das marés máximas daquele ano). Além disso, tais terrenos estão localizados exclusivamente nas áreas situadas no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés. Ademais, contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.

Por serem bens imóveis da União, há várias peculiaridades envolvendo o seu uso e disposição por particulares, e por entes públicos que não sejam a União. Uma das principais implicações relativas aos que habitam terrenos de marinha é pecuniária. Transações onerosas dessas áreas acarretam no pagamento de laudêmio à União. Ainda, o regime de ocupação (morador tem apenas posse) e de aforamento (morador tem domínio útil), via de regra, obrigam, respectivamente, ao pagamento anual da taxa de ocupação e do foro.

Em que pese a extensão dos terrenos de marinha estar descrita no Decreto-Lei n. 9.769/1945, cabe à Secretaria do Patrimônio da União – SPU demarcá-los. Atualmente, a SPU o faz com base na Orientação Normativa ON-GEADE-002-01, aprovada pela Portaria SPU n. 162/2001.

Todavia, esta questão, já há muito tempo, gera controvérsias. Os critérios aprovados pela Portaria da SPU são muito criticados por especialistas pelo fato de, em tese, terem extrapolado o disposto no Decreto-Lei n. 9.769/1945 e culminado com a demarcação de áreas que, na verdade, não são terrenos de marinha.

O que acontece é que em breve pode haver uma grande reviravolta envolvendo a demarcação dessas áreas. O Projeto de Decreto Legislativo n. 157/2017, já aprovado no Senado e agora pendente de aprovação na Câmara dos Deputados e posterior promulgação pelo presidente do Senado, prevê simplesmente que seja sustada, por vício de legalidade, a aplicação da Orientação Normativa ON-GEADE-002-01 e todos os processos administrativos demarcatórios que a tenham utilizado.

A justificação do Projeto de Decreto Legislativo encampa a tese de que, sem respaldo legal, a ON-GEADE-002-01 ampliou, modificou e exorbitou o disposto no Decreto-Lei n. 9.760/1946, que trata dos bens imóveis da União.

A despeito dos diversos posicionamentos e controvérsias a respeito dos terrenos de marinha e dos critérios de sua demarcação, o que é certo é que se o Projeto de Decreto Legislativo n. 157/2017 entrar em vigor, a maré mudará rigorosamente de lado, uma vez que a União deixará de arrecadar valores bastante significativos.

Quanto aos ocupantes de terreno de marinha, por ora, cabe analisar o art. 2 do Projeto, que prevê os casos em que os procedimentos e atos de demarcação serão sustados, e aguardar a definição desta maré, que ainda está longe de viver dias de calmaria.

Por Nelson Tonon Neto

Postado em 07/03/2017

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