Art. 48 da Lei de Crimes Ambientais: um pequeno feroz

No contexto da Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 9.605/1998), não faltam controvérsias e debates acirrados. Todavia, um crime que, à primeira vista, parecia não muito assustar, vem ganhando destaque cada vez maior no âmbito das ações criminais ambientais.

Com pena máxima baixa para os parâmetros do diploma (detenção de 6 meses a 1 ano e multa, frente a sanções que podem chegar a mais de 6 anos de reclusão), o art. 48 tipifica a conduta de “impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação”.

Sem adentar nos debates acerca do que efetivamente caracterizaria as florestas e demais formas de vegetação criminalmente relevantes para o amplo delito, o art. 48 podia ser considerado “dos males, o menor”: além de admitir os benefícios despenalizadores da suspensão e da transação, a prescrição pela pena em abstrato é de apenas quatro anos (art. 109, V, Código Penal).

Ocorre que, como hoje em voga na jurisprudência do eg. Superior Tribunal de Justiça e de boa parte dos Tribunais pátrios, vem se entendendo deter o crime ora debatido natureza permanente. É o caso, por exemplo, da manutenção de construções em área de preservação permanente, que, muito embora erigidas há décadas, continuariam a impedir dia após dia que a vegetação se regenere, permanecendo o acusado em cometimento da infração penal, sem autorizar o transcurso do lapso prescricional.

Levando ao pé da letra, não removido o suposto empecilho à regeneração das florestas, mesmo após a autuação administrativa ou oferecimento da denúncia, não se iniciaria jamais a contagem do prazo prescricional, instituindo indevido crime imprescritível, modalidade prevista apenas à Constituição Federal ao tratar do racismo e da ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

Encarando a controvérsia, ao tratar de situação em que não removida a obstrução à regeneração natural, adotou o eg. STJ entendimento no sentido de que “a instauração da ação penal delimita as condutas a serem apuradas, de modo que o recebimento da denúncia deve ser tido como termo inicial do prazo prescricional dos fatos a ela anteriores” (EDcl no REsp n. 1459944/SC, in DJe 01/08/2016). “Daí a necessidade de interromper, ainda que artificialmente, a permanência”, tomando como marco inicial da prescrição do art. 48 o recebimento da denúncia, concluiu a Corte Superior.

Possível ainda, como também recentemente decidiu o STJ, ser o art. 48 absorvido (instituto da consunção) pelo art. 64 da mesma Lei, referente a promover construção em solo não edificável sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida. Retomando posicionamento anterior, consignou a Corte que “o crime de destruir floresta nativa e vegetação protetora de mangues dá-se como meio necessário da realização do único intento de construir casa ou outra edificação em solo não edificável, em razão do que incide a absorção do crime-meio de destruição de vegetação pelo crime-fim de edificação proibida” (REsp 1639723/PR, in DJe 16/02/2017).

É que, como registrado ao acórdão, “aquele que constrói uma edificação, claramente não poderá permitir que dentro daquela venha a nascer uma floresta. É mero exaurimento do crime de construção indevida, pelo aproveitamento natural da coisa construída”, prevalecendo o crime previsto no art. 64, de cunho instantâneo e pena idêntica ao controverso art. 48.

Por Beatriz Campos Kowalski

Postado em 21/02/2017

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