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05/06/2025
Reflexos do Projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental e de sua aprovação pelo Senado Federal
09/06/2025O ônus da prova é o dever que os litigantes em processos judiciais têm de demonstrar a veracidade de suas alegações, que refletirá ou não na existência do direito reclamado. A regra de ouro é que o autor deverá comprovar o fato constitutivo de seu direito, enquanto ao réu cabe demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor[1].
Como quase tudo no direito, entretanto, é claro que existem exceções. No direito ambiental, a matéria foi consagrada pela Súmula 618, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), impondo que a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental.
Isso quer dizer que, em ações judiciais que perseguem a responsabilização por danos ao meio ambiente, é aquele que os cometeu que deverá demonstrar que o que está sendo lhe imputado não ocorreu, que não houve dano por sua ação ou omissão. É a aplicação, pelo STJ, do chamado princípio in dubio pro natura. Na tradução livre, se o julgador estiver em dúvida, deverá decidir o caso em benefício do meio ambiente.
O problema é que desde que tal entendimento foi sumulado, o Poder Judiciário tem sistematicamente aplicado seu teor sem analisar adequadamente cada caso, invertendo o ônus da prova em toda e qualquer ação com temática ambiental.
É certo, contudo, que a súmula não é autoaplicável. Como já decidido pelo próprio STJ, a inversão do ônus não constitui medida automática em todo e qualquer processo judicial. É imprescindível que o juiz a fundamente, demonstrando seu convencimento acerca da existência de pressupostos legais[2].
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) também reconhece que a Súmula 618/STJ, ainda que orientadora, não tem aplicação absoluta e de maneira geral em qualquer causa que envolva o meio ambiente, devendo ser analisado caso a caso pelo julgador quanto aos requisitos da redistribuição dos encargos probatórios[3].
O primeiro passo, nesse sentido, é a demonstração inequívoca de um dano propriamente dito, cuja inversão do ônus probatório servirá para obrigar o causador a demonstrar que não o cometeu. A existência de dano é indispensável[4].
Depois porque a inversão do ônus da prova somente tem cabimento quando demonstrada a impossibilidade, a excessiva dificuldade, ou a maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário em uma ação que busca responsabilização por dano ambiental.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), por exemplo, exige a presença de elementos mínimos que justifiquem a alegação de degradação ambiental antes de transferir o encargo ao réu. Para a Corte, a inversão do ônus da prova não pode ser presumida, devendo ser fundamentada na vulnerabilidade da produção de provas pelo autor (hipossuficiência) e na existência de prova mínima do alegado (verossimilhança).
É por esse motivo que, em ações ambientais movidas pelo Ministério Público, o TJRS tem negado a inversão do ônus da prova, entendendo que o órgão ministerial de forma alguma pode ser considerado hipossuficiente, dispondo de aparelhagem e departamentos específicos para investigação e trato das questões ambientais[5].
A compreensão geral dos Tribunais é que a aplicação da Súmula 618 deve ser feita de maneira ponderada, levando em consideração os princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como a necessidade de garantir um processo justo e equilibrado.
As decisões citadas reforçam que a inversão do ônus da prova em matéria ambiental não é automática e deve ser fundamentada em elementos concretos que justifiquem sua aplicação. Evita-se, dessa forma, a imposição de um ônus excessivo ao réu e se preserva a equidade no julgamento das ações ambientais, que é um princípio indissociável do processo.
[1] CPC – Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
[2] STJ, Resp 773171/RN, Rel. Ministro Herman Benjamin, Publicação em 15/12/2009.
[3] TRF-4, Agravo de Instrumento nº 5020595-77.2023.4.04.0000, Quarta Turma, Relator Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, Publicação em 24/07/2024.
[4] TJ-PR, Agravo de Instrumento nº 0057746-67.2021.8.16.0000, Relatora Maria Aparecida Blanco de Lima, 4ª Câmara Cível, Publicação em 02/03/2022.
[5] TJRS, Agravo de Instrumento nº 5214037-16.2024.8.21.7000, 22ª Câmara Cível, Relatora Marilene Bonzanini, Publicação em 18/11/2024.
Publicado em: 09/06/2025