O uso da água de lastro para o controle do calado e da estabilidade de navios consiste em um procedimento de segurança operacional adotado em algumas operações de embarque e desembarque de cargas. Contudo, tendo em vista que tais atividades podem provocar impactos ambientais relacionados à introdução de organismos aquáticos nocivos e agentes patogênicos nos ecossistemas costeiros, faz-se necessária a observância pelas embarcações de normas específicas de gerenciamento da água de lastro.
No plano internacional, o tema já vem sendo intensamente debatido há décadas e mereceu destaque na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982 e em outros acordos internacionais posteriores. A Organização Marítima Internacional (International Maritime Organization – IMO), por meio do seu Comitê de Proteção do Ambiente Marinho (Marine Environment Protection Committee – MEPC), tem exercido um papel de extrema relevância, por meio da edição de atos normativos, entre eles, a Resolução IMO n° A.868(20).
No âmbito das negociações coordenadas pela IMO, foi adotada, em 13 de fevereiro de 2004, a Convenção Internacional sobre Controle e Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios. Com a adesão da Finlândia, ocorrida em 08 de setembro de 2016, foram cumpridos os requisitos necessários para a entrada em vigor do referido acordo, o que ocorrerá em 08 de setembro de 2017. No Brasil, a internalização dessa convenção no ordenamento jurídico pátrio foi formalizada por meio do Decreto Legislativo n° 148/2010.
Entre as medidas fixadas, os países signatários do acordo deverão desenvolver políticas e programas nacionais relacionados ao gerenciamento da água de lastro e envidar esforços de cooperação entre si, inclusive para o desenvolvimento de pesquisas científicas. Além disso, diversas regras foram estabelecidas para navios que utilizam água de lastro, as quais passarão a ser mandatórias gradualmente, conforme o ano de construção e a capacidade de lastro das embarcações.
No Brasil, a convenção específica sobre água de lastro se juntará ao marco regulatório já existente, fundamentado, principalmente, em um tripé de atos normativos: (i) a Lei Federal n° 9.966/2000; (ii) a NORMAM-20/2005 da Diretoria de Portos e Costas (DPC); e (iii) a Resolução n° 72/2009 da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Além das normas aplicáveis aos navios que utilizam água de lastro, muitos órgãos ambientais, incluindo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), vêm exigindo a implementação de Planos de Gerenciamento de Água de Lastro no âmbito do licenciamento ambiental de portos organizados e terminais de uso privado. Em geral, tais planos têm como objetivo o acompanhamento preventivo do cumprimento das normas sobre água de lastro pelas embarcações que utilizam as instalações portuárias, além de ações de monitoramento de espécies exóticas e patogênicas no ambiente.
Nesse sentido, é fundamental que o Plano de Gerenciamento de Água de Lastro seja bem elaborado e executado pelas instalações portuárias, a fim de evitar eventos de bioinvasão e, de forma potencial, a responsabilização pelos impactos ambientais gerados, tendo em vista que, na esfera cível, impera a teoria objetiva, que dispensa a comprovação de dolo ou culpa. Em princípio, a pessoa física ou jurídica responsável pela instalação portuária poderá ser enquadrada na figura do “poluidor indireto”, nos termos do artigo 3º, inciso IV, da Lei Federal n° 6.938/1981.
De todo modo, é indispensável que a eventual atuação diligente dos empreendedores seja sempre levada em consideração, já que não apenas o meio ambiente e as comunidades costeiras, como também as instalações portuárias, são vítimas dos impactos causados pela introdução de espécies invasoras no ambiente. Deve-se, portanto, priorizar as ações de fiscalização dos armadores e demais responsáveis pela operação das embarcações, os quais possuem a responsabilidade direta pelo gerenciamento adequado da água de lastro, conforme se denota da própria convenção internacional relacionada ao tema.
Por Miguel Frohlich
Postado em 14/11/2016
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