3 Dúvidas frequentes sobre a Lei da Mata Atlântica

A Mata Atlântica é um dos principais biomas de nosso território nacional. Presente em 17, dos 27 estados da federação¹. A riqueza de sua biodiversidade, com mais de 20.000 espécies de flora e fauna, fez com que o constituinte o elevasse a patrimônio nacional em nossa Constituição Federal 1988 (art. 225, §4º).

A utilização, conservação, proteção e regeneração do bioma mata atlântica estão previstas na Lei n. 11.428/2006 – Lei da Mata Atlântica, regulamentada pelo Decreto n. 6.660/2008. 

No entanto, muitas dúvidas pairam sobre a utilização de áreas desse bioma na hora de empreender.  Por isso, nesse artigo, trazemos 3 dúvidas frequentes sobre o assunto e suas respectivas respostas a fim de auxiliar no dia a dia do empreendedor. 

  1. Como sei que meu projeto está inserido no bioma Mata Atlântica?

Conforme mencionamos no início, o bioma mata atlântica encontra-se presente ao longo de 17 estados brasileiros: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Alagoas, Sergipe, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. 

Contudo, deve-se observar que para que o regime jurídico da Lei da Mata Atlântica seja aplicado em uma determinada área, existem dois pré-requisitos. O primeiro é que a vegetação existente seja alguma das cinco formações florestais ou algum dos cinco ecossistemas associados previstos no art. 2º da lei. O segundo pré-requisito é que essas formações florestais e ecossistemas associados estejam sobrepostos a áreas definidas pelo Mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.  

Destaca-se que as ditas formações florestais são: Floresta Ombrófila Densa; Floresta Ombrófila Mista, também denominada de Mata de Araucárias; Floresta Ombrófila Aberta; Floresta Estacional Semidecidual; e Floresta Estacional Decidual. E, os ecossistemas associados: os manguezais, as vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste.

Além disso, deve-se atentar que somente os remanescentes de vegetação nativa no estágio primário e nos estágios secundário nos níveis inicial, médio e avançado de regeneração na área de abrangência delimitada no mapa terão o uso e conservação regulados pela lei (art. 2º, parágrafo único). 

  1.  Meu empreendimento é de utilidade pública. Preciso fazer Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para suprimir vegetação primária e secundária em estágio avançado de regeneração de mata atlântica?

Depende. O parágrafo único do art. 20 e o art. 22, da Lei da Mata Atlântica trazem a previsão expressa de que nos casos de obras, projetos ou atividades de utilidade pública, o corte e supressão de vegetação primária e/ou secundária em estágio avançado de regeneração devem ser precedidos de Estudo de Impacto Ambiental (EIA). 

Contudo, cumpre destacar que o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais-IBAMA, ao analisar o disposto no capítulo que trata de meio ambiente na Constituição Federal, possui um entendimento que não é categórico. Isso porque a exigência de EIA advém do art. 225, § 1º, IV de nossa Carta Magna. Nele, a obrigatoriedade da realização desse estudo somente é prevista para os casos de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental. Ou seja, nem todos os projetos de utilidade pública prescindiriam da realização de EIA/Rima.    

Assim, a análise realmente deve ser feita caso a caso. Mas a premissa deve ser a configuração da existência de uma significativa degradação, um significativo impacto ambiental, a partir de uma eventual supressão para que seja determinada a realização de um  EIA. E isso pode ser feito por meio de outros estudos, de maneira preliminar, sem que haja desperdícios de recursos humanos e econômicos².  

Esse entendimento do órgão ambiental federal, e de sua Procuradoria Federal Especializada, está disposto na Orientação Jurídica Normativa (OJN) n. 51/2015. 

  1. Preciso de anuência do IBAMA para autorizar o corte e supressão de vegetação nativa de mata atlântica nos casos de loteamentos ou edificações? 

A Lei da Mata Atlântica prevê 3 regimes jurídicos distintos para corte e supressão de vegetação. O regime geral, aplicável aos casos de utilidade pública e interesse social (art. 14). O regime especial para loteamentos e edificações em áreas urbanas e regiões metropolitanas (arts. 30 e 31). Por fim, o regime especial voltado às atividades minerárias (art. 32). 

Em resumo, da leitura da norma, o que se vê é que a anuência prévia do IBAMA é prevista apenas para os casos de utilidade pública e interesse social.  O regramento para anuência encontra-se no art. 19 do Decreto n. 6.660/2008, bem como na Instrução Normativa do IBAMA n. 09/2019. Sobre esse ponto, de forma complementar, sugerimos a leitura do artigo “ A anuência do IBAMA para supressão de vegetação de Mata Atlântica”³. 

No entanto, já houve controvérsia sobre a necessidade de anuência nos casos de loteamentos e edificações. Contudo, em 2015, a Consultoria Jurídica junto ao MMA emitiu o Parecer n. 368/2015/CGAJ/CONUR-MMA/CGU/AGU, manifestando-se pela desnecessidade de anuência do IBAMA para os casos de autorização para supressão de vegetação dessas atividades. O atual entendimento fez com que a OJN n. 39/2012 fosse invalidada. 

Assim, podemos afirmar que não há a necessidade de anuência do IBAMA para a supressão de vegetação de Mata Atlântica necessária a implantação de loteamentos e/ou edificações. 


1  BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Fundação de Ciência, Aplicações e Tecnologia Espaciais. Mapa de Vegetação Nativa na Área de Aplicação da Lei nº 11.248/2006 – Lei da Mata Atlântica. Brasília, 2015. Disponível em: https://antigo.mma.gov.br/images/arquivos/biomas/mata_atlantica/Relatorio%20Final%20Atualizacao%20do%20Mapa%20de%20cobertura%20vegetal%20nativa%20da%20Mata%20Atlantica%201.pdf. Acesso dia 03/02/2022.

2  BENJAMIN, Antonio Herman V. In: BENJAMIN, Antonio Herman V., MILARÉ, Édis. Estudo Prévio de Impacto Ambiental. São Paulo: RT, 1993, p.112

3  Disponível em https://www.saesadvogados.com.br/2019/04/02/a-anuencia-do-ibama-para-supressao-de-vegetacao-de-mata-atlantica/

Publicado em: 29/03/2022

Por: Gleyse Gulin

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