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11/08/2025A redação da Lei Geral do Licenciamento (Lei nº 15.190/2025), publicada na última sexta-feira, após os vetos do Presidente da República, ainda está sendo assimilada pelos operadores do direito, inclusive com a expectativa de eventual derrubada de veto pelo Congresso.
Um dos pontos que acabou não avançando foi a proposta de revogação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 14 da Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428/2006). Tais dispositivos preveem o seguinte:
- o órgão ambiental estadual deve autorizar a supressão de vegetação primária e secundária no estágio avançado de regeneração para os casos de utilidade pública, e a supressão de vegetação secundária em estágio médio de regeneração para os casos de utilidade pública e interesse social. Nessas situações deve haver a anuência prévia, quando couber, do órgão federal ou municipal de meio ambiente;
- o órgão ambiental municipal deve autorizar a supressão de vegetação no estágio médio de regeneração situada em área urbana, desde que o município possua conselho de meio ambiente, com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual.
Como se vê, por meio do art. 14, §§ 1º e 2º, a Lei da Mata Atlântica estabeleceu as regras para a autorização de supressão de vegetação aplicáveis aos casos de utilidade pública e de interesse social.
Ocorre que, cerca de cinco anos depois, sobreveio a Lei Complementar nº 140/2011 para fixar normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção ambiental.
O art. 13, §2º da Lei Complementar dispõe que “a supressão de vegetação decorrente de licenciamentos ambientais é autorizada pelo ente federativo licenciador”. Com isso, infere-se que toda supressão de vegetação associada a um processo de licenciamento sempre deverá ser aprovada pelo próprio órgão licenciador, que é definido conforme as regras de competência da Lei Complementar nº 140/2011.
No entanto, o art. 11 prevê que “a lei poderá estabelecer regras próprias para atribuições relativas à autorização de manejo e supressão de vegetação, considerada a sua caracterização como vegetação primária ou secundária em diferentes estágios de regeneração, assim como a existência de espécies da flora ou da fauna ameaçadas de extinção”. Nesse contexto, pode-se afirmar que as regras da Lei da Mata Atlântica mantiveram-se resguardadas.
Contudo, nesse cenário, numa interpretação literal, os Municípios, ou até mesmo a União, ainda que competentes pelo licenciamento ambiental, não poderiam autorizar a supressão de vegetação primária e secundária no estágio avançado de regeneração para os casos de utilidade pública, e tampouco a supressão de vegetação secundária em estágio médio de regeneração para os casos de utilidade pública e interesse social.
As razões que levaram ao veto foram no sentido de que a revogação contraria o interesse público e incorre em vício de inconstitucionalidade por representar um retrocesso ambiental, uma vez que “retira da atuação do órgão ambiental federal a competência para avaliar o status de conservação do bioma e a capacidade de suporte diante das múltiplas solicitações de supressão entre Estados e Municípios, que, se realizadas de forma descoordenada, implicariam a sua destruição gradual”.
Em nosso entendimento, as razões do veto descredibilizam todo o arcabouço voltado ao licenciamento ambiental que surgiu a partir da Lei Complementar nº 140/2011, e vão de encontro ao avanço da municipalização do licenciamento ambiental que vem ocorrendo nos últimos anos. Não há superioridade entre os órgãos ambientais. A explanação de que se a supressão de vegetação de Mata Atlântica estiver nas mãos dos órgãos estaduais e municipais pode resultar na destruição gradual do bioma é uma afirmação bastante preocupante.
Além do mais, a própria mensagem de veto parece cair em contradição quando assevera que o procedimento de anuência não corresponde a uma dupla análise. Por que manter a anuência no ordenamento jurídico se, no fim das contas, anuir não é autorizar? Isso significa (e já há precedentes nesse sentido) que concedida a anuência ou não, não há vinculação da decisão quanto à emissão de autorização de supressão de vegetação.
Assim, as razões que justificaram o veto não parecem ter sido as mais apropriadas. Na prática, por enquanto, fica tudo como antes. Seguimos acompanhando.
Publicado em: 11/08/2025
Por: Manuela Hermenegildo