O que está valendo para APP de restinga

A primeira designação jurídica de restinga foi estabelecida na Resolução CONAMA n. 04, de 1985, que a definia como “acumulação arenosa litorânea, paralela à linha da costa, de forma geralmente alongada, produzida por sedimentos transportados pelo mar, onde se encontram associações vegetais mistas características, comumente conhecidas como “vegetação de restingas”” (art. 2º).

Em 2002, a referida Resolução foi revogada pela Resolução CONAMA n. 303, que acrescentou pequenas modificações ao conceito de restinga. Já em 2012, o novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012) passou a definir restinga como “depósito arenoso paralelo à linha da costa, (…) com cobertura vegetal em mosaico, encontrada em praias, cordões arenosos, dunas e depressões, apresentando, de acordo com o estágio sucessional, estrato herbáceo, arbustivo e arbóreo, este último mais interiorizado (art. 3º, XVI).

Assim, fica claro, a partir da leitura das definições de restinga, que há uma formação geológica e há um tipo de vegetação de restinga.

Desde 1965, por meio do antigo Código Florestal (Lei n. 4.771/1965), a vegetação de restinga existente nas restingas (formações geológicas) é considerada de preservação permanente, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangue (art. 2º, f).

O Código atual, na mesma linha, prevê que as restingas (vegetação), como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues, são consideradas áreas de preservação permanente (art. 4º, VI).

A Resolução CONAMA n. 303/2002, com o intuito de regulamentar o antigo Código Florestal (Lei n. 4.771/1965) no que concerne às áreas de preservação permanente, criou nova hipótese de APP de restinga. Nesse sentido, a alínea a do inciso IX do art. 3º passou a estabelecer que a área situada em faixa mínima de 300 metros, medidos a partir da linha de preamar máxima constitui APP, independentemente da presença de vegetação de restinga.

Via de regra, APP não pode ser instituída por um ato normativo regulamentar como Resolução do CONAMA, que é ato secundário. Desse modo, tal regulamentação acabou por gerar um conflito do regime jurídico de proteção das restingas, pois houve uma inovação quanto às hipóteses de APP sem o respaldo de lei ou outro ato normativo primário.

Em algumas oportunidades, o CONAMA chegou a debater a possibilidade de revogar a alínea a do art. 3º, IX da Resolução n. 303/2002. Em 2010, chegou a ser instaurado um procedimento administrativo com a finalidade de revisar a Resolução n. 303, mas a sua tramitação acabou ficando paralisada em razão das discussões acerca do novo Código Florestal, que estava prestes a ser aprovado.

Com o advento da Lei n. 12.651/2012, muitos defendiam a não recepção da Resolução diante da ausência de fundamento de validade no ordenamento jurídico brasileiro. Alguns anos depois, o CONAMA instituiu um Grupo Assessor com o objetivo de avaliar os impactos da legislação superveniente.

Em 2020, a Resolução CONAMA n. 500 foi editada a fim de reconhecer a revogação das Resoluções n. 284/2001, 302/2002 e 303/2002. No entanto, no exame das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 747, 748 e 749, ajuizadas, respectivamente, pelo Partido dos Trabalhadores (PT), pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e pela Rede Sustentabilidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) restabeleceu a vigência e eficácia das referidas Resoluções.

Assim, neste momento, a Resolução CONAMA n. 303/2002 encontra-se válida.

No que tange ao mérito, o voto da relatora Min. Rosa Weber pontua que a Resolução é plenamente compatível com o marco legal em vigor. Não obstante, embora diga que não é possível suprimir as Resoluções do ordenamento, reconhece que elas podem passar por atualização ou ajuste, caso necessário. Entretanto, não se tem conhecimento (e nem expectativa) de criação de procedimento junto ao CONAMA para a atualização ou ajuste da Resolução CONAMA n. 303/2002.

Nesse contexto, remanesce o conflito jurídico acerca da legalidade da alínea a do art. 3º, IX da Resolução n. 303/2002. Ainda, em que pese não ter adentrado na análise desse dispositivo especificamente, o STF legitimou a competência do CONAMA para inovar no ordenamento.

Por: Manuela Hermenegildo

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