Crimes ambientais e responsabilidade societária: desafios que persistem

Completados vinte e cinco anos de vigência da Lei de Crimes Ambientais, a responsabilidade penal pela prática de crimes contra o meio ambiente continua sendo alvo de polêmicas e debates. O problema é maior quando se fala na responsabilidade das pessoas jurídicas e das pessoas físicas inseridas em um contexto societário.

A Lei n. 9.605/1998, que previu o microssistema de responsabilização pela prática desses crimes, regulamentou a imputação criminal às pessoas jurídicas. Também previu que, incidem nas penas lá previstas, o diretor, o administrador, o membro do conselho de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário que, sabendo da prática criminosa, deixa de impedi-la.

No começo, o que causou maior problema foi a responsabilidade criminal das PJs e, especificamente, a regra da “dupla imputação”. A responsabilidade das pessoas jurídicas só era possível se houvesse a responsabilização simultânea das pessoas físicas internamente responsáveis pelas condutas criminosas.

Em 2013, o STF mudou a regra, considerando a dificuldade de individualização dos agentes subordinados à PJ que tinham participação ou omissão nos atos infracionais. Segundo a Corte, “em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual”1

No entanto, o fim da dupla imputação não resolveu o problema

Todos os desafios relacionados ao sistema de penalização societária continuam presentes, visto que, nestes ambientes, imperam as características descentralização e distribuição de funções, qualidades estas que levaram o STF a rever o sistema de penalização simultânea das pessoas físicas e pessoas jurídicas. 

Com isso, a decisão acabou assumindo a existência de um grave gargalo originado dos crimes societários: a não rara tentativa de fazer valer uma responsabilidade penal objetiva – aquela que prescinde a presença da intenção. Ao escancarar a dificuldade de identificação dos agentes infratores, a decisão sinalizou a existência das chamadas “denúncias genéricas” e de imputações infundadas, cenário que há muito vinha se repetindo.

Quando o assunto é a proteção ao meio ambiente, a questão é delicada. A tentativa de reduzir a impunidade pela prática de crimes ambientais está há algum tempo em voga, em especial após os drásticos desastres de Mariana e Brumadinho. Propostas de agravamento de penas previstas para crimes ambientais são, até hoje, objeto de discussão no legislativo. 

Mas uma coisa não muda: a responsabilidade penal é sempre subjetiva. Não há exceção a essa regra. Mesmo nos casos de crimes societários e de autoria coletiva, é absolutamente imprescindível que se demonstre o vínculo da pessoa física com a conduta criminosa2. Não basta, assim, que pessoas físicas sejam denunciadas em razão do cargo que ocupam dentro da empresa.

A repetição dos Tribunais é necessária e qualquer coisa diferente disso deve ser combatida, respeitando-se os princípios basilares da temática. 


STF, RE 548.181, Relatora Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, DJe 30-10-2014

2 STJ, AgRg nos EDcl no RHC n. 162.662/SC, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 28/11/2022, DJe de 2/12/2022

Publicado dia: 20/04/2023

Por: Ana Paula Muhammad

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