Espécie ameaçada de extinção prevista em listagem internacional atrai competência federal para julgamento de crime ambiental?

Em um artigo anterior, abordamos, em linhas gerais, a competência da Justiça Federal para processamento e julgamento de crimes ambientais, esclarecendo que, para a fixação da competência, é imprescindível que o crime tenha sido cometido em detrimento de bens, serviços ou interesse da União (art. 109, IV, da Constituição Federal). 

Apesar da previsão constitucional, é comum que questões específicas sejam suscitadas perante o Poder Judiciário, sobretudo em relação ao interesse da União, mencionado no dispositivo. O presente artigo, portanto, tem o objetivo de abordar uma dessas questões, respondendo à seguinte pergunta: Espécie ameaçada de extinção prevista em listagem internacional atrai competência federal para julgamento de crime ambiental?

A resposta depende de um elemento essencial para a fixação da competência: o caráter transnacional do delito. Isso significa que, se o crime ultrapassar as fronteiras nacionais, a competência para julgamento será, de fato, da Justiça Federal. Caso contrário, seguirá a regra geral de competência da Justiça Estadual, uma vez que ausente interesse específico da União. 

Relembra-se, aqui, que o interesse da União não pode ser genérico. Pelo contrário, deve ser direto e específico, não podendo ser presumido.

É nesse sentido que o Supremo Tribunal Federal editou o Tema 648, fixando a seguinte tese: Compete à Justiça Federal processar e julgar o crime ambiental de caráter transnacional que envolva animais silvestres, ameaçados de extinção e espécies exóticas ou protegidas por compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.

No Recurso Extraordinário n. 835558, leading case da discussão, o STF destacou o interesse direto da União e a transnacionalidade ao entender que “In casu, cuida-se de envio clandestino de animais silvestres ao exterior, a implicar interesse direto da União no controle de entrada e saída de animais do território nacional, bem como na observância dos compromissos do Estado brasileiro perante a Comunidade Internacional, para a garantia conjunta de concretização do que estabelecido nos acordos internacionais de proteção do direito fundamental à segurança ambiental.”

Assim, é possível concluir que, para a fixação da competência da Justiça Federal é necessário que o crime (i) envolva espécie ameaçada de extinção prevista em listagem internacional ratificada pelo Brasil, e (ii) que esteja presente, no caso concreto, o caráter transnacional do delito. Quando analisados individualmente, tais requisitos não atraem, por si só, a competência federal.

Publicado dia 31/07/2023

Por: Jaqueline de Andrade

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