Uma breve análise sobre a nova Política Nacional de Qualidade do Ar (PNQAr)

A Política Nacional de Qualidade do Ar (PNQAr) foi instituída recentemente[1] pela Lei Federal n. 14.850/2024.  Até então, a Resolução CONAMA n. 05/1989, que instituiu o Programa Nacional de Controle da Qualidade do Ar (PRONAR), bem como a Resolução CONAMA n. 491/2018, que estabelece os padrões de qualidade do ar, eram as normativas que tratavam da matéria. 

A norma composta por 3 (três) Capítulos está dividida em: (i) Disposições Gerais (art. 1º e 2º), (ii) da Política Nacional de Qualidade do Ar (arts. 3º ao 22) e (iii) Disposições Transitórias (art. 23 a 26).

A PNQAr estabelece princípios, objetivos, instrumentos e diretrizes relativas à gestão de qualidade do ar no território nacional. A normativa se aplica a todos os responsáveis pela emissão de poluentes atmosféricos, gestão da qualidade do ar e controle da poluição. Ou seja, de empreendedores a agentes fiscalizadores.

As definições, previstas nos incisos do art. 2º, tratam sobre diversos temas relacionados à matéria. Entre eles, constam definições sobre poluentes atmosféricos[2], inventários de emissões[3], emissão atmosférica[4] e fontes de emissão atmosférica[5], entre outros. 

Seus princípios e objetivos estão em linha com as Políticas Nacional de Meio Ambiente (Lei Federal n. 6.938/81) e sobre Mudanças Climáticas (Lei Federal n. 12.187/2009). Especificamente sobre o combate às mudanças climáticas, a PNQAr prevê dentre seus princípios uma visão sistêmica, na gestão da qualidade do ar, que considere as diferentes fontes de emissões e as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública (art. 3º, III). Busca-se dentre seus objetivos a redução progressiva das emissões e concentrações de poluentes atmosféricos, bem como o alinhamento com as políticas de combate à mudança do clima, o que essa visão sistêmica vem a auxiliar.

Os 10 (dez) instrumentos, dispostos nos incisos do art. 5º, servirão para alcançar seus objetivos[6].  Desses, os padrões de qualidade do ar (art. 5º, II), o monitoramento da qualidade do ar (art. 5º, III), o inventário de emissões atmosféricas (art. 5º, IV), planos de gestão de qualidade do ar (art. 5º, V), Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitorAR) (art. 5º, VIII), e os incentivos fiscais, financeiros e creditícios (art. 5º, IX) ganham subseções específicas.

Os padrões de qualidade do ar permanecem os estabelecidos pela Resolução CONAMA n. 491/2018 e já integram o Programa Nacional de Controle a Qualidade do Ar (PRONAR). No entanto, nesse ponto, deve se atentar que por força da decisão tomada no exame da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6148, a resolução deverá ser atualizada – no prazo de 24 (vinte e quatro) meses da publicação (DOU de 11.10.2022) do Acórdão. Para tanto, o CONAMA deverá  considerar as diretrizes estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2021, à luz da realidade nacional, das peculiaridades locais, dos primados da livre iniciativa, do desenvolvimento social e da redução da pobreza[7].

Quanto ao monitoramento da qualidade do ar cabe destaque ao realizado nas fontes fixas emissoras que deverão atender aos termos estabelecidos em licenciamento ambiental, em conformidade com os regulamentos existentes. Os dados obtidos pelas estações de monitoramento da qualidade do ar, vinculadas às condicionantes ambientais, deverão ser integrados ao MonitorAr[8].

A forma como os inventários de emissões atmosféricas serão elaborados será definida em regulamento. De toda forma, a política estipulou o que seria um conteúdo mínimo a ser contemplado no instrumento, quais sejam: (i) fontes de emissão atmosférica, (ii) poluentes inventariados, (iii) distribuição geográfica das emissões por regiões definidas pelo órgão ambiental competente, consideradas as principais fontes de emissão, (iv) metodologia de estimativa de emissões; e (v) lacunas de informações identificadas no inventário e respectivas providências para sua correção (art. 12). Releva notar que da forma como o art. 11 trata o inventário de emissões atmosféricas não resta claro aqui se a norma abarcou apenas o inventário jurisdicional e/ou corporativo. No entanto, em seu parágrafo único define a forma de participação dos Municípios na elaboração de inventários estaduais.  

Os planos de gestão de qualidade do ar, por sua vez, englobam o Nacional, Estaduais, Distrital e para Episódios Críticos de Poluição do Ar. O Plano Nacional deverá ser elaborado no prazo máximo de 2 (dois) anos após a publicação do Inventário Nacional de Emissões Atmosféricas, com vigência por prazo indeterminado, porém uma perspectiva de duração de 20 (vinte) anos. A normativa estabelece como conteúdo mínimo um diagnóstico com a identificação das principais fontes de emissões atmosféricas e os seus impactos no meio ambiente e na saúde, prognóstico, metas e prazos para atingimento dos padrões de qualidade do ar, de acordo com diretrizes estabelecidas pelo CONAMA. Os planos estaduais e distritais seguem as mesmas diretrizes estabelecidas para o plano nacional (art. 16), por outro lado, não há qualquer menção na norma sobre os planos para episódios críticos de poluição do ar.

Os incentivos fiscais, financeiros e creditícios previstos dentre os instrumentos da Política Nacional de Qualidade do Ar são abordados nos arts. 19 a 22. Estes deverão estar em consonância com a Lei de Responsabilidade Fiscal ( Lei Complementar n. 101/2000), bem como com as diretrizes e objetivos do plano plurianual, metas e diretrizes orçamentárias.

Ressalta-se que a lei restringe acesso a recursos financeiros da União, caso os Estados e o Distrito Federal não elaborem,, os inventários, planos de qualidade do ar, programas de controle e dos relatórios de qualidade do ar,  dentro dos prazos estabelecidos na norma. A liberação desses recursos está condicionada ao cumprimento das exigências previstas na lei, por exceção dos casos em que os instrumentos de repasse já tenham sido celebrados.

Por fim, os órgãos ambientais estaduais e distritais que já tenham elaborado planos de controle de emissões atmosféricas (art. 5º, da Resolução CONAMA n. 491/2018) deverão compatibilizá-los e integrá-los com o respectivo plano de qualidade do ar (art. 24, da Lei Federal n. 14.850/2024).


[1] Publicada no Diário Oficial da União em 03/05/2024.

[2] III – poluente atmosférico: qualquer forma de matéria em quantidade, concentração, tempo ou outras características que torne ou possa tornar o ar impróprio ou nocivo à saúde, inconveniente ao bem-estar público, danoso aos materiais, à fauna e à flora ou prejudicial à segurança, ao uso e gozo da propriedade ou às atividades normais da comunidade;

[3] VII – inventário de emissões de poluentes atmosféricos: conjunto de informações sobre as emissões atmosféricas geradas por fontes ou grupo de fontes localizadas em uma área geográfica específica, em um intervalo de tempo definido;

[4] IX – emissão atmosférica: liberação de poluentes na atmosfera em uma área específica e em um período determinado a partir de fontes de poluentes atmosféricos;

[5] X – fontes de emissão atmosférica: quaisquer atividades ou processos oriundos de causa natural ou antropogênica, por fontes fixas, móveis ou difusas, que resultem na liberação na atmosfera de substâncias nas formas particulada, gasosa ou aerossol, acompanhadas ou não de energia, capazes de causar alterações no ambiente atmosférico.

[6] Art. 5º São instrumentos da Política Nacional de Qualidade do Ar: I – os limites máximos de emissão atmosférica;  II – os padrões de qualidade do ar; III – o monitoramento da qualidade do ar; IV – o inventário de emissões atmosféricas; V – os planos, os programas e os projetos setoriais de gestão da qualidade do ar e de controle da poluição por fontes de emissão; VI – os modelos de qualidade do ar, os estudos de custo-efetividade e a proposição de cenários; VII – os conselhos de meio ambiente e, no que couber, os de saúde, bem como os órgãos colegiados estaduais e municipais destinados ao controle social; VIII – o Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitorAr); IX – os incentivos fiscais, financeiros e creditícios; e X – o Fundo Nacional do Meio Ambiente, o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

[7] Caso isso não ocorra, passarão a vigorar os parâmetros estabelecidos pela OMS.

[8] Portaria MMA nº 386/2021.

Publicado dia: 20/05/2024

Por: Gleyse gulin

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