A desnecessidade de EIA/RIMA para empreendimentos localizados na Zona Costeira.

A Zona Costeira brasileira possui uma extensão territorial de 8.500 km, possuindo, de acordo com o Censo de 2010 do IBGE, 26.5% da população, o que correspondia na época a 50,7 milhões de habitantes. 

Buscando proteger essa região, em maio de 1988 foi promulgada a Lei 7.661/1988, que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro. No parágrafo único do artigo 2º a norma apresenta o conceito de Zona Costeira como “o espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definida pelo Plano.”. 

Considerando a definição vaga apresentada pela lei, tornou-se necessário regulamentação posterior para delimitar que municípios estariam enquadrados dentro da Zona Costeira. Atualizando a listagem de dezembro de 2018, em fevereiro de 2021 o IBAMA publicou a Portaria MMA nº 34. A título de curiosidade, são listados 33 municípios no estado do Rio de Janeiro, 41 em Santa Catarina e 16 em São Paulo. 

Acontece que um dos artigos da norma tem gerado certa confusão por parte de alguns operadores do direito. Ao mencionar a necessidade de que os processos de licenciamento ambiental devem seguir as diretrizes do Plano de Gerenciamento Costeiro, além das disposições federais, estaduais e municipais, o parágrafo segundo acabou tratando especificamente da necessidade de EIA/RIMA: 

§ 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental – RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei. (Grifo Nosso).  

Para a correta leitura do dispositivo é preciso se atentar a uma importante consideração: a Lei 7.661/1988 é anterior à Constituição Federal de 1988, e a sua leitura deve ser feita atualmente a partir dos seus preceitos. 

É verdade que até o advento da Constituição existiam muitas divergências sobre o conceito de Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental, sendo tratados muitas vezes como algo semelhante à Avaliação de Impacto Ambiental e aos Estudos Ambientais. Porém, a redação do artigo 225, inciso IV, deixa claro que o EIA/RIMA é uma das modalidades de Estudos Ambientais, cabível nos casos em que a atividade ou empreendimento for considerado potencialmente causadores de significativo impacto ambiental.

Assim, as normas que vieram posteriormente já se adequaram a esse entendimento constitucional, como por exemplo o artigo 3º da Resolução CONAMA 237/1997, que regulamenta o processo de licenciamento ambiental federal. 

Ao realizarmos a leitura do §2º da Lei 7.661/1988, anterior à Constituição, precisamos entender que apenas será exigível a apresentação de EIA/RIMA nas hipóteses previstas no artigo 225, inciso IV, ou seja, caso o empreendimento seja potencialmente causador de significativo impacto ambiental. 

Entendimento divergente levaria a uma série de absurdos, como a construção de uma residência domiciliar, que fora da Zona Costeira seria inclusive autorizada sem necessidade de licenciamento ambiental, precisar apresentar todas as exigências previstas na Resolução CONAMA 01/1986, que disciplina a elaboração do EIA/RIMA, estudo de custo milionário

Ao contrário do que talvez possa se imaginar, além de inconstitucional, esse entendimento não traria maior proteção ao meio ambiente, mas sim estimularia a ocupação ilegal da Zona Costeira e sobrecaregaria os órgãos ambientais com estudos desnecessários, causando prejuízos administrativos e socioeconomicos. 


¹Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. […] IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

²Em artigo anterior tratamos com maior atenção os conceitos mencionados: https://direitoambiental.com/licenciamento-ambiental-em-pauta-no-stf/. Acesso dia 30 de outubro de 2021. 

³A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetivas ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA). 

Publicado dia: 03/11/2021

Por: Mateus Stallivieri

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