Burocracia e Setor Portuário: Velhos fantasmas precisam ser superados para um Brasil pós-crise

Tem sido amplamente divulgado e debatido pela mídia e por especialistas os dois efeitos diretos da pandemia causada pelo COVID-19. O primeiro, mais imediato e visível, ocorre na área da saúde com a lotação de UTIs e o colapso do sistema. O segundo, aparentemente mais discreto e que deve atingir o país com ainda mais força no futuro próximo é o impacto econômico. 

No primeiro semestre de 2020 se estima que a economia nacional já sofreu refração de 0,6% do PIB[1], chegando ao número de 12,9 milhões de desempregos. Os dados se tornam ainda mais alarmantes quando verificadas as previsões para o restante do ano, podendo chegar a um decrescimento de 4% e alcançando o índice de 17,8 % de desemprego[2]

Em um ambiente instável o grande desafio dos próximos anos será a retomada do crescimento, algo facilmente constatável mas que se vincula a uma série de variáveis. A economia brasileira é dependente da exportação e importação de produtos, correspondendo a primeira a 13% do PIB e a segunda 12%[3]

Essas atividades são intimamente ligadas às condições de infraestrutura, principalmente no tocante ao transporte de cargas e mercadorias, sendo a atividade portuária crucial nessa relação. 

Em 2012 dos 466 milhões de dólares movimentados pelo comércio exterior 80% foi por via portuária. O número se torna ainda mais expressivo analisando a partir do critério de peso das cargas, onde corresponde a 95% das 688 milhões de toneladas comercializadas. 

Mesmo com números volumosos a situação estrutural do setor ainda pode ser considerada precária no país, principalmente devido a dificuldades burocráticas na instalação e procedimentalização de novos empreendimentos e investimentos. 

Uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional das Indústrias – CNI revelou que somente a ineficiência portuária brasileira gera gastos adicionais de 4,3 bilhões anuais ao setor produtivo, enquanto os constantes atrasos nas obras de infraestrutura deixam de gerar mais de 6,3 bilhões de caixa aos investidores[4] .  

No mesmo material é exposto que as duas maiores dificuldades para a atividade portuária são as falhas na priorização de obras, a falta de incentivos para os investimentos privados e as dificuldades encontradas no licenciamento ambiental[5]

Em relação ao último ítem a CNI destaca três fatores em específico: a demora, custo e imprevisibilidade existente no trâmite; a falta de clareza dos Termos de Referência; e a insuficiência na estrutura dos órgãos responsáveis pelo licenciamento. Esses fatores não são surpreendentes quando consideramos um contexto nacional com aproximadamente 55 mil normais ambientais.  

Esse ambiente de insegurança jurídica afasta os avanços necessários para a atividade, causando prejuízos para todo o setor produtivo. Levando em conta essas dificuldades torna-se evidente que a ausência de um marco legal para o licenciamento ambiental traz constantes prejuízos ao desenvolvimento, impedindo a ampliação da infraestrutura e a possível retomada econômica. 

A pandemia e todas as adversidades que esta carrega consigo precisam servir de impulso para a modernização do país, que não se pode dar mais ao luxo de perder investimentos e recursos devido a problemas burocráticos que atravessam décadas. É necessário retomar o debate quanto a aprovação da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, legislação tão esperada pelo setor[6], garantindo segurança jurídica e potencializando o investimento, instalação e operação de obras cruciais. 

Que as primeiras ondas causadas pelo COVID-19 trarão dificuldades e estagnação já não se discute, é um fato. Cabe agora saber se o baque permitirá ou não a superação de fantasmas que já assombravam o nosso desenvolvimento, entre eles a questão da infraestrutura portuária e a insegurança para se investir.   


[1] https://exame.abril.com.br/economia/consultoria-ve-pib-do-brasil-caindo-3-em-2020-devido-a-pandemia/

[2] https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2020/03/26/internas_economia,837834/banco-central-zera-projecao-do-pib-do-brasil-em-2020.shtml

[3] https://www.nexojornal.com.br/grafico/2019/05/03/Quanto-o-com%C3%A9rcio-exterior-representa-do-PIB-dos-pa%C3%ADses

[4] https://noticias.portaldaindustria.com.br/artigos/wagner-cardoso/o-no-burocratico-no-setor-portuario/

[5] https://bucket-gw-cni-static-cms-si.s3.amazonaws.com/media/filer_public/3a/ed/3aed2704-e0d5-4a7c-b20d-6fdb3f7bc7ee/estudo_burocracia_setor_portuario.pdf

[6] https://www.saesadvogados.com.br/2020/03/13/licenciamento-ambiental-seguranca-juridica-ou-desastre-2/

Por Mateus Stallivieri da Costa

Publicado dia 11/05/2020

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