A maré pode virar: terrenos de marinha em discussão no STF

Os terrenos de marinha, em sua concepção, eram áreas consideradas estratégicas pelo Poder Público no tocante à economia, acesso ao mar e defesa considerando eventuais ataques marítimos. Essas áreas são até hoje bens da União medidos a partir da linha do preamar-médio de 1831 em 33 metros para o interior do continente ou para o interior das ilhas costeiras.

Em setembro de 2019, foi proposta perante o Supremo Tribunal Federal a ADPF 639 com o objetivo de discutir a constitucionalidade da Orientação Normativa conhecida como “ON-GEADE-002”, publicada pela Secretaria de Patrimônio da União (“SPU”). Referida orientação traz como objetivo principal “(…) Estabelecer as diretrizes e os critérios para a demarcação de terrenos de marinha e seus acrescidos, naturais ou artificiais, por meio da determinação da posição da Linha de Preamar Média de 1831 – LPM e da Linha Limite dos Terrenos de Marinha – LTM”.

Alega-se na ADPF 639, proposta pelo Partido Liberal, que há afronta a alguns preceitos constitucionais fundamentais. No tocante à separação de poderes entende-se que a SPU (i) extrapolou seu poder regulamentador com a criação de um novo marco regulatório, legislando sobre bens da União, afronta direta ao art. 20, VII c/c com o art. 48, V da CF; e (ii) desrespeitou a competência constitucional para expedir decretos e regulamentações, a qual seria prerrogativa do Presidente da República, e no presente caso deu-se por outro agente público, desacatando o art. 84, IV da CF.

De mais a mais, constatou-se afronta também ao direito fundamental à propriedade, estabelecido pelo art. 5º, inciso XXII da Constituição Federal, o qual foi incisivamente violado uma vez que o novo marco regulatório trouxe restrições e obrigações a propriedades que antes não eram abarcadas pela demarcação dos terrenos de marinha, prejudicando este direito fundamental dos proprietários como um todo.

Destaca-se que aqueles que possuem propriedade no interior dessas áreas podem estar sujeitos ao pagamento de (i) foro; (ii) taxa de ocupação; e (iii) laudêmio. Além desses pagamentos exigidos, entraves no processo de licenciamento ambiental, custos extras e burocracia podem afetar negativamente os empreendimentos existentes bem como possíveis investimentos futuros nesses espaços.

Diante desse cenário, quem possui imóveis em terrenos de marinha precisa de muita diligência para que eventuais obras a serem realizadas na área estejam em conformidade com o que dispõe a legislação sobre o assunto, além de estar atento a demandas judiciais em trâmite, como a ADPF 639 aqui comentada, que pode representar uma mudança de maré em relação ao assunto.

Por Tainá Espúrio Pereira

Publicado dia 12/05/2020

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