Meio ambiente e comércio internacional: a nova Lei britânica

Em trâmite no Reino Unido desde 2020[1] o Projeto de Lei do Meio Ambiente, que dá providências sobre metas, planos e políticas de melhoria ambiental, foi aprovado em novembro de 2021. Uma provisão interessante dessa nova Lei, e que pode impactar o cenário produtivo brasileiro, diz respeito à meta de tornar obrigatório que grandes empresas que operam no Reino Unido realizem o dever de diligência para eliminar qualquer desmatamento que não estiver de acordo com a legislação local de suas cadeias de abastecimento agrícola e florestal. Isso porque, até então, no Reino Unido havia apenas compromissos voluntários para garantir que os produtos comercializados no país não tenham procedência em fontes de desmatamento de áreas de risco. Essa lei só é aplicada a empresas sediadas no Reino Unido que negociam commodities específicos (a serem definidos em legislação secundária), sendo que as empresas não conformes estarão sujeitas a multas.

 Durante a sua elaboração, o projeto sofreu algumas críticas. A eliminação do desmatamento ilegal das cadeias de suprimentos das grandes empresas parece insuficiente para muitos críticos, diante do cenário global de tendências não sustentáveis. A World Wide Fund for Nature – WWF divulgou em agosto de 2021 um Relatório sobre a exposição do setor financeiro do Reino Unido ao desmatamento ilegal, mostrando que  £ 40 bilhões podem estar em risco por conta da produção de soja e carne bovina no Brasil e do óleo de palma na Indonésia – commodities cuja produção é frequentemente associada com o desmatamento. Por isso, a WWF fez um apelo ao governo britânico para que fosse assegurado que os bancos nacionais e outros investidores não estejam financiando o desmatamento ilegal ao redor do mundo. O apelo, no entanto, não obteve sucesso – a Lei só engloba as empresas que comercializam determinados commodities, excluindo quem as financia.

Para as empresas sediadas no Reino Unido a aprovação desse Projeto de Lei significa uma sobrecarga de deveres relacionados ao rastreamento de mudanças em legislações em diferentes jurisdições. Já para as empresas brasileiras, a aprovação do Projeto de Lei britânico pode significar uma mudança de postura em relação ao cumprimento das leis ambientais locais. Isso porque no ano de 2021, 1,09% das exportações brasileiras foram destinadas ao Reino Unido. Ainda que pareça pouco, isso significa US$154.785.517 em exportações de soja e US$82.212.583 em exportações de preparação e conservas de carne bovina só naquele ano.[2]

Segundo um outro Relatório produzido em julho de 2021 também pela WWF, até 2030 estima-se que 30,4 milhões de hectares de vegetação natural no Brasil serão convertidos em terras agrícolas para suprir a demanda de soja do Reino Unido. Desse montante, 2,1 milhões de hectares não estão compreendidos por qualquer forma de proteção legal. Ou seja, 2,1 milhões de hectares não sofrerão interferência da Lei britânica, que só faz menção ao desmatamento considerado ilegal pela legislação local.

Mesmo assim, de agora em diante, o mercado brasileiro deve ficar atento às mudanças impostas por esta nova Lei. Isso porque a norma é atualmente um dos pacotes de medidas mais ambiciosos no que diz respeito a metas de proteção ao meio ambiente de enfrentamento da crise climática. Por conta disso, essa Lei pode estabelecer um precedente internacional, elevando o nível de exigência também em outros países, especialmente na União Europeia.

Além disso, uma nova pesquisa, conduzida pela Earthsigh e publicada no dia 11 de maio deste ano, associa o fornecimento de carne de frango para a Europa à violação de direitos indígenas no Brasil, reforçando a necessidade de legislação secundária para a Lei do Meio Ambiente para incluir, na medida do possível, a proteção dos direitos indígenas e para cobrir a comercialização de carne de frango alimentado com soja. Nesse caso, os impactos no mercado brasileiro podem ser ainda maiores. Por isso, caberá ao setor produtivo brasileiro estabelecer medidas para se adequar às novas exigências do mercado internacional.


[1] Em 30 de janeiro de 2020 foi realizada a introdução formal do Projeto com a sua primeira leitura na Câmara dos Comuns.

[2] Informações disponíveis em: http://comexstat.mdic.gov.br/pt/geral/58806.

Publicado dia: 06/06/2022

Por: Isabella Dabrowski Pedrini

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